Instruções para ler este artigo ao som de “Verdes Anos”, de Carlos Paredes.
Não quero que este seja apenas mais um artigo sobre o 25 de Abril de 1974 com uma relação de todas as conquistas e falhanços que daí sucederam até aos dias de hoje.
Quero antes gritar aos cabos do mundo que dobramos e às ondas nazarenas que derrubamos no Atlântico, no Índico e no Pacífico, pedindo para que acordem os portugueses que bóiam como mobiliário descartado do Titanic, esquecendo o contributo imprescindível de si próprio na construção do imenso Portugal do Chico Buarque.
A tristeza com que olhamos o passado dos últimos (verdes) anos ao som das cordas de Carlos Paredes, encadeiam-nos e cega-nos a esperança de vivermos numa rua onde não há nem corrupção nem outro lixo a entupir as sarjetas, numa rua onde as pessoas partilham os livros e as plantas do seu quintal.
Mas é possível. Porque não há impossíveis, só há improváveis! E depois de recebermos com sucesso mais de 500 mil portugueses das ex-colónias, ainda é provável que consigamos calcetar a pedra portuguesa nessa rua em que vive Portugal.
Quando penso na resposta à “pergunta dos 10 mil euros: o que falta a Portugal para definitivamente romper com o status quo de que nada vai mudar?”, só me surge uma solução, a solução para tudo: Educação. E portanto, enquanto o leitor questiona se estou a sugerir que os portugueses poderiam ser melhor educados, reitero que uma sociedade parcamente desenvolvida e pouco participativa na vida comunitária, só pode ser uma sociedade com baixos níveis de educação e de qualificação moral, social e académica.
No relatório “How’s Life 2017”, publicado em novembro de 2017, a OCDE aponta Portugal como um país com um incremento na decaláge na participação pública nos atos eleitorais legislativos. Em 2015, menos 8% da população portuguesa participou nas eleições legislativas comparativamente a 2005. Em 2015, quase metade da população portuguesa não votou para um dos maiores órgãos de soberania.
Se é dramática a participação em eleições nacionais, mais dramática é a realidade na participação na vida interna dos partidos políticos. O mesmo relatório desnuda como são poucos os países – Suíça, Chile, Eslovénia, Japão e Polónia – a terem uma taxa de abstenção superior à portuguesa, assim como casos próximos ao nosso nas eleições imediatamente após o 25 de Abril, em que a participação em eleições legislativas está acima dos 90%, como no Luxemburgo.
Em 2014, o Partido Socialista foi o primeiro partido a abrir-se à sociedade e a permitir não militantes a votarem e a decidirem o futuro do partido e, mais objetivamente, a decidirem quem seria o candidato do Partido Socialista a primeiro-ministro nas eleições legislativas de 2015. Foi um total de 177 mil pessoas que votaram nas primárias. Quase 2% de portugueses participaram na escolha do candidato do PS.
João Nogueira Santos numa exposição de ideias que fazia já no ano de 2011, no TEDx Lisboa, intitulada a “Adesão massiva aos partidos políticos”, explora como Portugal, até à data, tinha 0,65% da sua população a participar nas decisões (leiam-se eleições) internas dos partidos políticos e que, comparativamente aos Estados Unidos da América, Portugal, para um país quatro vezes mais velho, fica muito aquém. Os EUA apresentavam uma percentagem de 18% de população a participar nas eleições internas dos partidos políticos.
Não deixa de ser bizarro um país quatro vezes mais velho ter uma participação nas instituições democráticas (leiam-se partidos políticos) vinte e cinco vezes inferior. Não são só números ou proporções. É uma realidade inglória e assustadora.
Por outro lado, o mesmo país (EUA) elegeu Donald Trump para seu timoneiro político.
De qualquer modo, há um problema sério em Portugal e um problema que todos (não só os políticos) temos que encarar de frente e responsabilizarmo-nos sobre ele: a falta de participação no futuro coletivo, mas intrinsecamente individual.
E, por isto, se está a ler este artigo, não se perca no romantismo dos cravos de ’74 e encontre caminhos para continuarmos todos os dias a revolucionar Portugal. E é possível, até porque não há impossíveis, só improváveis. O Trump foi eleito e nós tivemos uma revolução quase sem tiros.