Quantos de nós prestam atenção ao outro apenas pelo que ele é e não pelo que ele tem?
Quantas vezes avaliamos o outro pela aparência e nos afastamos se aquele não tiver um bom aspeto?
Quantas vezes não nos interessa dar o devido valor a alguém que connosco trabalha, apenas porque só temos olhos e ouvidos para nós mesmos?
Quantos juízos de valor fizemos acerca de alguém e depois nos arrependemos amargamente por sermos injustos?
Quantas vezes, por seres diferente, não te levaram a sério?
Vou ficar por aqui, porque não quero aborrecer o leitor com tantas questões, ainda que, estando em final de ano, deveríamos fazer um balanço das nossas atitudes para com o outro e aferirmos se o saldo é positivo ou negativo.
Se depois de analisado o conjunto, o passivo e o ativo, o seu rosto for iluminado com a luz intensa de um sorriso, ou com lágrimas de alegria, valeu a pena viver todos os dias deste ano que chega ao fim, porque fez e deu o seu melhor, parabéns!
Viver é maravilhoso, é uma dádiva que devemos agradecer todos os dias, porque é uma oportunidade de aprendizagem única. O segredo é saborear, sentir e absorver cada instante como se fosse o último, porque é e disso não restam dúvidas.
Muitos de nós ainda não despertaram para o que é viver de verdade. Uma percentagem considerável de pessoas vive totalmente absorvida pela ambição de “ter”: fortuna, poder, domínio sobre o outro… E são engolidos pela voragem de sentimentos e emoções menos agradáveis e sem se aperceberem transformam-se em peças de uma imensa engrenagem impiedosa que lhes absorve a identidade de nascença.
Chegámos a esta vida nus e partimos com vestes simples e isto diz tudo.
Não temos nada. “Tudo” é apenas emprestado. Se assim é, porque nos custa tanto partilhar, dar?
Lamentável é que muitos de nós só despertam para a realidade da essência da vida quando algo de muito forte lhes acontece. Então aí, somos como que sacudidos. Muitos, depois de recuperados do “abanão”, prosseguem com a mesma postura menos positiva, contudo, outros renascerão e transformar-se-ão em pessoas benignas e verão com outros olhos a vida e a sua relação com o outro.
Ser é, de facto, muito importante. Termos muitos bens materiais e sermos vazios de sentimentos, de saúde, de amigos… Tem algum relevo? Não!
A nossa maior fortuna nesta vida é, sem dúvida, a nossa saúde e as amizades verdadeiras. Quando a saúde nos falta, tudo rui à nossa volta e até quem nós mais amamos, muitas vezes, foge para bem longe de nós. Resta-nos os amigos autênticos, se os tivermos, e de um punhado deles, em situações menos boas, sobram poucos.
Já sentiu e viveu isso, caro leitor? Constatou, portanto, que o “ter” não tem tanta importância como o “ser”?
É tão bom quando gestos tão simples, como escutar, abraçar, partilhar, rir, chorar… fazem a diferença na vida do outro.
Sermos lembrados pelo bem que fizemos com atitudes tão sentidas, porém, simples e benignas na vida de alguém é maravilhoso, não há dinheiro algum que dê tamanha felicidade e alegria.
Passar por alguém e ser abraçado, porque se foi fundamental na vida daquela pessoa, lembrarem-se de como fomos importantes para o despoletar de determinada situação simples, como: comer, falar, andar, acreditar é demasiado precioso.
SER é significativo demais para ser menosprezado e posto em segundo plano em nossas vidas, porque na nossa origem está o verbo “ser”.
Vou terminar esta minha opinião com as palavras de Fernando Pessoa, num poema alusivo ao “SER”.
Põe quanto és no mínimo que fazes
Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa.
Põe quanto és no mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha porque alta vive.