“Que horas ela volta?” resulta num bem estruturado apelo à consciencialização pelos direitos laborais das tradicionais ‘domésticas’, cujas vidas, privada e profissional, se interligam num emaranhado de contradições, costumes e privações.
A obra, da realizadora brasileira Anna Muylaert, conta a história de Val, uma empregada doméstica, de uma abastada família de São Paulo. Val vive na mesma casa dessa família que a trata de forma inferior, traçando uma distinção categórica entre esta e as demais pessoas que entrem na casa. Paralelamente, é constante a retórica de que Val é um elemento da família, tendo a mesma inclusive uma forte ligação com Fabinho (filho da família onde trabalha), dado que o viu crescer, desenvolvendo inclusive um laço quase maternal com ele. A relação destes é também instrumentalizada – quase de forma inconsciente – pela família, o que gera, na empregada doméstica, uma dependência emocional do trabalho.
Val, uma vez que partilha casa com os ‘patrões’, tem um trabalho a tempo inteiro, 24 horas por dia, sem direito a descanso ou gozo da sua vida privada. No filme, não há uma clara delineação das funções de Val, fazendo um pouco de tudo, a toda a hora.
A empregada doméstica provém de um dos estados mais pobres do Brasil e a mesma deslocou-se para São Paulo para ter condições de dar uma vida minimamente condigna à sua filha. É a partir do momento que a sua filha, Jéssica, se decide mudar para São Paulo para estudar que Val começa a ganhar consciência da sua posição social, inferior, por sinal, a todo o ciclo que a rodeia, uma vez que esta estava sozinha em São Paulo e o seu único ciclo social era a família para a qual trabalhava.
O filme reflete a vida de inúmeras domésticas interinas, cuja vida profissional é a sua vida no geral. Há um claro apelo ao debate sobre o tema, à banalização destas lesivas condições laborais, vistas como normais, não apenas no Brasil, mas em todo o mundo.