OPINIÃO: Desigualdade Salarial – Não a vemos, logo não existe?

Muitos se perguntam se a desigualdade salarial não é um mito, um eco das feministas histéricas ou até um verdadeiro exagero.

Ora bem, embora a questão não seja nova, aproveitamos o mote dado ao direito das mulheres, com ou sem batom vermelho, para dar a este tema a relevância que ele merece (e deveria ter).

Mais do que uma manobra política, um capricho ou uma mera ocasião é a verdadeira luta das mulheres pela igualdade, seja ela de oportunidades, participação ativa na sociedade ou até salarial.

E se é certo que esta caminhada já contornou muitos obstáculos ao longo da história, mais certo é que há ainda um extenso caminho a percorrer, pois apesar da participação da mulher no mercado de trabalho ter evidenciado um progresso sem precedentes, denotam-se ainda muitas desigualdades. Por um lado, porque as medidas que são apregoadas apenas “tapam sol com a peneira” e por outro lado porque, geralmente e sem motivo aparente, quando surge a oportunidade e principalmente quando está em causa um cargo de relevo, a mulher qualificada com capacidades é, muito frequentemente, substituída pelo homem “amigo do amigo” menos qualificado.

Embora não seja este o tema principal do presente artigo, não podemos deixar de referir que bem revelador de tal facto é a nomeação, já silenciada e pouco debatida, de um homem para o cargo de Procurador Europeu, quando a pessoa mais apta e mais qualificada (mulher) foi, miraculosamente, preterida. Tal facto evidencia bem a forma de como o Governo, um pecador assumido, tem contribuído (ou não) para a igualdade de género, dando um péssimo exemplo à nação.

Voltando ao tema, e tendo em conta que aceitar o problema é o primeiro passo para o resolver, diga-se, desde já, que as diferenças salariais entre homens e mulheres são uma realidade nos dias de hoje.

Cumpre-nos, no entanto, oferecer uma pequena explicação. A desigualdade salarial ou Gender Pay Gap passa por uma discriminação salarial em função do género, ou seja, os homens têm salários mais elevados do que a mulheres para realizarem um trabalho igual ou de igual valor.

Pondo, agora, de parte todos os argumentos oferecidos pelas teorias negacionistas, a verdade é que, como o algodão, os números não enganam: em Portugal, independentemente da profissão, as mulheres ganham cerca de 14,4% menos do que os homens, isto é, auferem uma remuneração base média mensal de menos 148,9 euros, o que corresponde a uma diferença, num ano, de 58 dias de trabalho. Consequentemente, estes dados espelham bem a posição vergonhosa que Portugal assume no ranking Europeu, a qual indicia que no nosso país são necessários 81 anos para atingir a igualdade.

E se há vozes que defendem que a desigualdade salarial é um mito, é com alguma facilidade que, recorrendo a casos concretos, rebatemos esse argumento. A título de exemplo, veja-se o caso da TAP em Portugal ou os casos das multinacionais Next, Asda, Sainsbury’s, Morrisons e da Tesco. O denominador comum nestas lutas é precisamente o facto de as mulheres ganharem menos do que os homens para o exercício do mesmo trabalho ou de conteúdo funcional idêntico e por isso estão a exigir judicialmente o equilíbrio dessa diferença injustificada, numa lógica de que se partilham as mesmas funções, o mesmo horário e as mesmas responsabilidades devem também partilhar o mesmo salário. Sendo que, não podemos desconsiderar que apesar destas mulheres estarem a tentar abrir um precedente, há muitas outras que se remetem ao silêncio, por vergonha, desconhecimento ou medo.

Face a tal conclusão, não podemos deixar de nos questionar como é que, no século XXI, se valoriza mais o trabalho de um homem do que o trabalho de uma mulher. Não será injusto?

Numa análise global, estando a sociedade estruturada com base nos resquícios de um passado de grande desigualdade, é certo que é necessário e fundamental encontrar o equilíbrio, de forma a contrariar essa tendência. Portugal apesar de recentemente ter sido acusado de violar o compromisso que assumiu de promover a igualdade de género a nível salarial, tem de, agora, apostar verdadeiramente em medidas que promovam a transparência das políticas salariais e o equilíbrio familiar, assumindo o verdadeiro repto de garantir que qualquer pessoa com vocação e capacidades, independentemente do género, tenha precisamente as mesmas oportunidades.

Mas, transfigurar o amanhã é também e sobretudo um papel de todos nós – mulheres e homens. Uns denunciando, outros recorrendo às vias judiciais e outros debatendo o assunto, pois agir é o primeiro passo para solucionar este problema disfarçado de mito.

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