OPINIÃO: Outra revolução na saúde dos portugueses

É indiscutível, 44 anos depois do 25 de Abril de 1974, a revolução, que a somar à dos cravos, também aconteceu na saúde dos portugueses. Vários dias após a perda nacional incalculável pela morte de António Arnault, é essencial que estimemos e potenciemos os ganhos do seu legado – o Sistema Nacional de Saúde.

Saltamos de um país com uma das taxas mais vergonhosas de mortalidade infantil da Europa, para um país com das mais baixas taxas de mortalidade infantil do mundo; saltamos de um país sem cuidados de saúde personalizados para um país onde poucos são os que não têm médico de família, saltamos de um Portugal com mortes por doenças transmissíveis, em que éramos os pobres de cordeiro às costas para pagar uma consulta médica, para um Portugal onde se morre maioritariamente por doenças não transmissíveis como consequência das mudanças erradas nos hábitos de consumo e de atividade física.

E é precisamente sobre o novo salto que falta do SNS diante os hábitos de vida dos portugueses e dos seus resultados, que este artigo foi escrito.

Desde que fui integrado na profissão médica, venho vendo o maior foco sobre as terapêuticas não farmacológicas que os clínicos dedicam diante dos seus utentes. Mas como tem isso surtido ganhos em saúde na comunidade portuguesa?

Na difícil apuração do que são ganhos imateriais e mais difícil ganhos em saúde, sabemos que o caminho até um Portugal mais saudável ainda vai a meio.

Em 2016, foi lançado pela Direção-Geral da Saúde o Programa Nacional para a Promoção da Atividade Física que deriva do Plano Nacional de Saúde, que, por sua vez, vai ao encontro das principais orientações internacionais na área, nomeadamente da Organização Mundial de Saúde. Este programa assenta na clarividência dos graves factos sobre a (in)atividade física em Portugal.

A inatividade física é um dos fatores de risco nucleares no desenvolvimento das doenças não-transmissíveis, com impacto significativo na saúde pública e, por isso, há hoje estimativas dos seus custos nos orçamentos da saúde a nível mundial desde 2016. Devem ser considerados dois aspectos essenciais na avaliação do peso da inatividade física nos custos de saúde: a relação da inatividade física com a mortalidade e com a doença e, depois, qual a prevalência da inatividade física.

De acordo com um estudo de 2015 de Arem H. e seus colaboradores, o risco de morte diminui gradualmente com o aumento da atividade física moderada em minutos por dia e que o efeito protetor da atividade física obtêm-se a partir de 20-25 minutos de atividade física moderada por dia, qual é um valor próximo do veiculado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) de 150 minutos por semana em atividades como caminhadas em passo rápido, a prática de um desporto, aulas de dança, exercício físico no ginásio, ou corrida.

A inatividade física em Portugal, de acordo com o Euro-barómetro de 2014 tem dados que merecem atenção. O último relatório revelou que 72% dos adultos portugueses nunca ou raramente fazem exercício ou desporto e apenas 23% cumpria as recomendações da OMS.

No Inquérito Nacional da Saúde de 2014, apenas 20% dos inquiridos com mais de 15 anos referia praticar exercício físico pelo menos três vezes por semana e a inatividade física surge como o fator de risco com maior prevalência de todos os avaliados.

Diante desta epidemiologia, estima-se que a inatividade física seja responsável por 8% dos casos de doença coronária, 11% das Diabetes do Tipo 2, 14% dos casos de cancro da mama e 15% de cancro colo-rectal. E mais grave é a percentagem de mortalidade atribuída à inatividade física no nosso país de 14%, ou seja, uma em cada sete mortes seria evitada se houvesse maior atividade física.

E é importante, numa era de contas certas, compreender quanto custa a inatividade física aos cofres do Estado e aos bolsos dos contribuintes. De acordo com um artigo da revista “Lancet”, no ano de 2016, o custo total da inatividade física em Portugal foi entre 210 e 460 milhões de euros, incluindo custos diretos e perdas de produtividade com mortalidade prematura.

Contudo, só se incluíram cinco das 22 doenças e condições que a atividade física comprovadamente previne, faltam somar vários custos diretos e indiretos pela dificuldade em apurar valores.

Foi ainda considerada uma prevalência de inatividade física para Portugal de 35%, um valor muito reduzido face à realidade ao que corresponde um custo de 900 milhões de euros para o Estado, face ao progressivo aumento dos custos de saúde nos próximos anos, justifica-se, por isso, uma estratégia e uma operacionalização objetiva na prevenção do sedentarismo, com o impacto no bem-estar individual, na prevalência das doenças não transmissíveis, na mortalidade e na economia. E essa tarefa cabe aos profissionais de saúde médicos que hoje têm a possibilidade prescrever através das suas plataformas de prescrição (PEM) e o sistema de saúde e as entidades que com ele cooperam têm que conseguir mecanismos para orientar e monitorizar a atividade física como se de um contágio tuberculoso se tratasse.

Não é esta a epidemia do séc. XXI? Para grandes problemas, grandes soluções.

Não pare diante deste flagelo e perceba que a sua saúde e a sua sustentabilidade e dos outros depende de si. Porque o António Arnault não vai desaparecer e virá outra revolução na saúde dos portugueses.

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