
Várias são as vezes que ouço dizer que esta palavra é muito portuguesa. Tenho as minhas dúvidas. Penso ser uma palavra dita de diferentes formas e idiomas e sentida por todos os seres humanos. Acrescento que até os seres irracionais sabem o que é a saudade.
Lembremo-nos dos nossos animais de estimação, que, em circunstâncias menos boas, sentem saudade dos seus donos, da ausência destes últimos, atrevo-me a ir mais longe, dizendo que até no reino animal selvagem, eles sentem saudade e choram a morte das suas crias e companheiros.
Quando nos encontramos longe dos que nos são queridos e mesmo do nosso país, não acredito que não sintamos saudade.
Saudade é um sentimento, com uma carga emocional enorme e sentida de diversas formas e vivenciada de maneiras desiguais.
Quem já não chorou por se encontrar longe do seu país e dos seus familiares por motivos diversos?
Desde a falta de assistência médica para tratamentos específicos, que se encontram mais avançados noutros países, passando pelos conflitos entre povos de uma mesma nação, ou não, e que se veem forçados a pedir a outras nações asilo, os refugiados. As dificuldades que encontram, porque tudo é novo e para além da enorme tristeza e saudade, há ainda o período de adaptação a uma nova realidade, longe de suas casas, e todos sabemos o quão difícil pode ser, apesar da solidariedade que possam encontrar junto dos povos que os acolhem.
Os portugueses, em tempos idos, também se viram forçados a sair do seu país pela fome, pela desigualdade social, pela falta de liberdade de expressão e por salários miseráveis, que não chegavam para alimentar as famílias numerosas e carentes.
De salientar que eram proibidos de sair do país, por isso, muitos, senão todos, tiveram que o fazer a “salto”, pela calada da noite, e o sofrimento que experimentaram nas suas vidas e as marcas que deixaram foram indeléveis.
França, a escolha de muitos portugueses, logo descobriu a capacidade de trabalho e sacrifício do povo português.
Os portugueses constituíram comunidades, onde se falava português, onde se matava a saudade, à noite, depois de um dia intenso de trabalho, cantando o Fado, partilhando histórias de vida, a saudade e o pouco que tinham uns com os outros. Dos Bidonvilles e depois de anos de árduo trabalho e de uma saudade enorme dos seus e do país, conseguiram juntar dinheiro, para fazerem as suas casas no país que os viu nascer. Voltaram e muitos conseguiram usufruir da felicidade, nas suas terras, depois de tantos anos de separação.
Há outros tipos de saudade: a saudade que sentimos pelos nossos familiares, que partiram para o outro lado da vida, apesar de se encontrarem bem dentro dos nossos corações, uma vez por outra, contudo, é difícil evitar ficarmos com os olhos marejados de lágrimas e estas brotam com força e de forma descontrolada. Por muito que digam que o tempo tudo cura, a saudade é difícil de curar, garanto-lhes.
A saudade do nosso trabalho de sonho. Aquele que nos enchia a alma de brilho e que nos fazia levantar, todos os dias, com uma vontade do tamanho do mundo, para fazer mais e melhor e que, de repente, por causa de uma invenção, chamada “crise” nos arrebataram do nosso trabalho que fazia parte das nossas existências, atirando-nos para um beco sem saída.
Muitos dos que me derem o privilégio de lerem estas minhas palavras, saberão e sentirão essa SAUDADE. Sabem como diminui a saudade que sinto da minha profissão? Eu sou locutora de Rádio, que é a minha paixão, pela qual sinto uma imensa saudade, então, neste momento sou voluntária da Biblioteca Sonora, da Biblioteca Pública Municipal do Porto, enquanto leio, com o maior dos prazeres, para invisuais, tento imaginar que estou dentro de uma cabina radiofónica e que estou a apresentar um programa e é desta forma que tento matar a saudade que, porém, persiste.
A saudade de um grande amor, que, de repente, por motivos inexplicáveis deixou de existir em nossas vidas, também deixa marcas que são difíceis de esquecer.
Não foi por acaso, nem continua a ser, que a SAUDADE inspira muitos poetas e anda na boca de muitos cantores.
Vou deixá-los com dois poemas que falam de SAUDADE.
“Saudade palavra doce
Que traduz tanto amargor:
Saudade é como se fosse
Espinho cheirando a flor…”
(Bastos Tigre)
“Rede ao vento
Se torce de saudade
Sem você dentro
Você deixou tudo a tua cara
Só pra deixar tudo
Com cara de saudade”
(Alice Ruiz)
Deixe uma resposta
Tem de iniciar a sessão para publicar um comentário.