
Crónicas Avulso
Tenho um certo gosto pelo analógico. Não descarto o digital, as vaidades da apple, por exemplo. É certo que o preço é elevado, mas a qualidade é ótima. Nunca tive um telemóvel tão bom como um iphone e também nunca tive um computador tão bom como um macbook air. Falando em qualidade, os airpods também são ótimos. Tudo caríssimo e é preciso estimar/esticar o máximo de tempo possível, pois não são coisas que se troquem facilmente.
Já tive outros dispositivos digitais e todos tiveram de ser reparados ou trocados ao fim de dois anos. Recentemente tive um computador portátil que me durou dois anos e meio. A bateria queimou e mais uma data de problemas. Felizmente fiz uma extensão de garantia e devolveram-me uma nota de crédito, cujo valor era suficiente para comprar a playstation 5. No fundo fiz uma troca, um computador emperrado por uma consola perfeita.
Mas vá lá, esta crónica não é de cariz publicitário. O meu ponto é precisamente o oposto. A fragilidade do digital. Recentemente descobri dois rolos guardados aqui por casa. Mandei-os revelar e descobri fotos de quando tinha seis anos. Portanto, os rolos estavam guardados há mais de dezasseis anos. Duvido que algum dos meus velhos telemóveis possam revelar-me alguma foto ao fim de dezasseis anos.
Juntamente com os rolos pensei em verificar o estado da velha máquina fotográfica dos meus pais. Percebi que era uma máquina alemã, 35 milímetros, e que funcionava na perfeição. Comprei um rolo. Aprendi a logística da fotografia analógica e por enquanto ando-me a divertir a fotografar a minha namorada e ela a mim. Não há como percecionar o resultado final da fotografia. Há um buraco através do qual olhamos e deduzimos o enquadramento. Depois faço a contagem mentalmente porque o contador está avariado. Faço girar a pequena roldana do lado direito até se dar um estalido e está pronta para uma nova fotografia.
O rolo dá para trinta e seis fotografias. Trinta e sete se for bem colocado. A revelação são seis euros e a impressão das fotos sai a sessenta cêntimos cada. É mais caro que simplesmente tirar fotos com o telemóvel e postar nas redes sociais, mas é diferente. Não há a escolha, não há como ser mesquinho. Não há edição. Carrego no botão e no final, depois de impressas, ficam como ficarem. Coloca-se num álbum e esperasse que daqui a outros dezasseis anos possamos olhar para elas com a mesma nostalgia com que eu olhei as recentemente reveladas.
Apercebi-me que a escrita “analógica”, numa hipotética máquina de escrever, também tinha essa característica. Se não gostássemos de uma palavra, de uma frase, de uma página inteira só havia a opção de rasgar tudo e principiar novamente. Uma grande diferença entre o analógico e digital é precisamente o resgate e o registo do erro humano. A descoberta pela tentativa erro. E há certos erros que amadurecem com o tempo e se tornam nalgo melhor. A constante decisão, cortes e escolhas do digital, elevam tudo à suposta perfeição que não sei se perdurará no tempo.
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